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sexta-feira, 4 de novembro de 2011

MINHA HOMENAGEM A GUIMARÃES ROSA



Pensando como uma Rosa

Pequenina prosa dedicada carinhosamente á João Guimarães Rosa


Deitado em minha rede nova, lá fora na varanda, estava, pós o almoço. Tinha ido á minha estante e escolhido um livrinho, entre tantos que eu tenho e adoro, lê-lo um pouco. De todos eles, peguei um de Guimarães Rosa, cujo nome não importa. Lia gostoso, suas palavrinhas, fui tomado de seu espírito. Tornei-me uma rosa. Fechei o livro, segui a balouçar com a rede, passei a ouvir o barulho de as galinhasinhas a farfalhar o mato, tagarelices. Estavam perto de mim, a discutir entre elas sobre quaisquer bobeirinhas de seus assuntos galináceos, todas ocupadas a procurar com seus inquietos biquinhos sabe-se lá o quê, no meio de toda aquela sujeira tão limpa de flores murchas e frutas não comidas, patinantes. Levantei de repente, como já tivesse tudo bem calculado comigo, fui para a cozinha do forno á lenha. Pergunto pra tia se tem algum fruto, mór de fazer refresco. Sem olhar pra mim, inda trabalhando muito séria com alguma coisa no tanque, me diz que tem morangos em um pote azul, na geladeira. Escolho cinco, dos mais gorduchos e vermelhentos, cheirosos, batendo-os em um liquidificador encardido que não tem mais botão. Para ligar, basta acendê-lo na tomada. Jogo o caldo em um copo grandão que escolhi (era de vidro vermelho, também), e enquanto fazia isso um dos gatos estava em cima da mesa, do meu lado, olhando bem de perto, curioso e intrometido, o que eu fazia, ver se era algo que ele também pudesse comer junto, ou tomar. Bichos estão sempre muito ocupados em querer comer. Comer, comer, comer. Minha cachorra chega a comer cascas de banana, se ela me vê comendo desses frutos. Só alface é que eles parecem não ver graça. As cachorrinhas, duas, andam sempre juntas como gêmeas (uma é preta, a outra branca), sempre pegam os bocados que eu jogo, no ar. Quando é alface, que jogo por maldadezinha besta, só pra me rir um pouco por dentro, delas, dão uma mastigadazinha, logo soltam de volta no chão, semgrassadas. Não acham do por que em se comer aquilo. Quando o suco acaba, viro o copo todo para comer as sementezinhas pequeninas dos morangos, mastigar. Tem um gosto-gostoso que parece cheiro de tinta óleo. Faz lembrar quando eu era menino, achava que ia ser pintor. Não fui. Minha pintura séria, morta e nervosa, não vingava. Chega a cachorrinha do meu lado, Pequeña. A boca aberta suando pela língua, como tivesse rindo. Seu pêlo bem quente, como o pãozinho saído do forno, mostra que ela estava correndo ao sol. Parece querer dizer, como uma criança, “você não imagina o que eu vi, agora agorinha! Vem aqui comigo ver, também!”. Algum tatu, ou uma lebrinha. O outro guitarrista da banda que eu toco disse que aqui, por esses lados do Alpes das Águas, nasceu tanta lebre pelo mato, que liberaram pra quem quisesse caçar, pra comer, ou só mesmo matar. Ele disse que elas debulharam com a plantação de milho do pai dele. Ontem, ou anteontem, não lembro mais, demos de cara com uma, saindo do meio do mato, quase entrando na frente do carro. Falei pra ele pra tentar alcançar ela, de brincadeira, então ele acelerou. O bichinho sentiu o farol fuscante trás dele, desatou de correr tão, mas tão rápido, que era lindo de se ver. Corria em enormes pulinhos, as orelhinhas deitadas pra trás, pulguinha branca gigante e peludinha. Que rápido! Quando quase alcançamos, desviamos, deixar o bichinho vivendo em paz. Mas que daria um churrasco bom, daria, pensei comigo. Ô, se daria.

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