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sexta-feira, 4 de novembro de 2011

POR QUE EU NÃO GOSTO DE FUTEBOL


“É de rolar de rir.”
Stephen McPeterson

Queridos amigos, hoje falaremos sobre um assunto que quase todos vocês – como bons brasileiros (ou argentinos) que são – irão adorar: hoje o nosso tema de dissertação será o futebol. (aplausos entusiasmados de todos)
Como de praxe, iremos analisar de forma semiótica-pragmática esse grande esporte nacional, e tentarei - na medida do possível, e de meus modestos conhecimentos - fazê-los entender os motivos de meu total desinteresse em acompanhá-lo como um torcedor.
(“é isso aí, Saides, mostra pra eles!”, grita alguma moça entusiasmada, no fundo da sala)

Bom, começaremos pelo princípio: (risadas gerais de todo o público) O futebol, antes de mais nada, é um esporte. (“claro”, “óbvio”, escuta-se pela sala) E – como esporte que é – trata-se de uma prática física metódica destinada a exercitar ao corpo e relaxar a mente de quem o pratica...
(algumas garotas – que não parecem estar prestando a menor atenção ao discurso – começam a gritar “lindo, lindo, lindo” em coro)

Pois bem, chegamos agora á primeira incógnita deste assunto: de que forma exercitaremos nosso corpo atuando como meros espectadores? (“blasfêmia!”, gritou algum ousado no fundo da sala, que logo foi dominado pela segurança) Chegamos á minha primeira máxima (por favor a todos, prestem muita atenção):

ESPORTE É PARA SER PRATICADO, E NÃO PARA SER ASSISTIDO.

(aplausos escandalosos – principalmente do público feminino – e a segurança leva minutos para conter ao público)
Calma, calma, peço a vocês, por favor, que não se exaltem – não por agora – e me esperem continuar com meus ousados argumentos. Entre nossa sociedade humana, ouso dividi-la de maneira sucinta – e generalizada – em apenas duas categorias: As pessoas que fazem, e as pessoas que assistem. (“você é o nosso herói, meu amor”, diz uma voz feminina ao fundo) Pois bem... As que fazem, são as que constroem e modificam ao meio, e as que assistem, apenas – no melhor dos casos – sabem criticar. Chego agora á minha segunda máxima que, aliás, dou grande ênfase por sofrer em minha própria pele suas conseqüências nefastas:

SE VOCÊ NÃO É CAPAZ DE FAZER MELHOR, VOCÊ NÃO TEM AUTORIDADE PARA CRITICAR.

(“o que você está fazendo, então, espertinho?”, alguém grita, para logo ser dominado pela segurança e posto para fora)
O que eu estou fazendo? O que eu estou fazendo é criticar ás pessoas que NÃO praticam esporte, apenas assistem - com suas barrigas enormes – e com o traseiro quadrado de passar o dia inteiro sentado em frente ao televisor. (agora os aplausos tornam-se ensurdecedores, e leva-se um tempo até o público novamente se acalmar. Uma anônima garota beija Saides á força, deixando-o encabulado, mas sorridente)

Bem, como acredito que se estendermo-nos ao esporte como um todo não terminaremos este assunto tão cedo, vou direto ao assunto principal em questão: falemos, finalmente, sobre o Futebol. (forma-se um coro de “Saides, Saides, Saides” no meio do salão, e subitamente uma linda garota desmaia, para logo ser socorrida)

Primeiro de tudo, sempre me perguntei: onde está o “interessante” em uma esfera de retalhos costurados de couro entrar em uma rede?
(“seria mais interessante jogarmos com a sua cabeça!” grita alguém, para logo depois ser atacado pelo público feminino e ter que sair correndo para não ser massacrado)
E o pior de tudo, e o mais intrigante: por que se grita, logo após que a esfera se introduz no tal arco, a palavra GOL?!... Gol? Que diabos é “Gol”? (forma-se um tumulto, pessoas começam a se empurrar, gritos contra e a favor do discurso, e Saides pára até o povo novamente se acalmar)

Tudo bem, admito que esteja sendo um tanto quanto jocoso em meus devaneios... Voltarei a falar – á partir de agora – com toda a minha seriedade e – acima de tudo – imparcialidade. Mas aviso-lhes agora que entrarei – implacável e soberbamente - no terreno mais árido d`este assunto, e com total e absoluto destemor:
(“pára de ser lindooo” grita alguém – aparentemente uma mulher)
O assunto, agora, serão os clubes futebolísticos. (vaias e aplausos se misturam em um completo forfé, fazendo com que Saides pare - por alguns segundos - para sorver um pouco de café.)

Temos muitos clubes de futebol, uns mais famosos, outros nem tanto, uns mais competentes, e outros menos. Cada um desses clubes possui um nome, um símbolo, uma seqüência predominante de cores, e um hino. Pois muito bem. Mas, além de tudo isso, cada um desses clubes possui seu mais precioso bem: seu querido – e fiel – público. (aplausos gerais de quase todos os presentes) Eu digo mais importante, mais precioso, porque seu público é tão particular, tão fiel, quanto todas as suas características supracitadas. Um torcedor - como um hino ou um símbolo - é para sempre. Pois muito bem. Agora, senhoras e senhores, o que me dizem de seus jogadores? São eles tão fiéis quanto seus torcedores? NÃO! Se temos um craque, já sabemos que ele logo mais mudar-se-á para a Europa.

Temos um artilheiro este ano, que no ano passado jogava no time rival. Todos os bons jogadores brasileiros sonham em algum dia jogar para os estrangeiros. Quem vai me dizer que não? Última máxima:

QUE SENTIDO FAZ EM SE TORCER POR UM TIME, QUE NA VERDADE É UMA COLETÂNEA, UM AMÁLGAMA DE EX JOGADORES RIVAIS?

Sabe, seria o mesmo que assistir á uma missa católica rezada por um pastor evangélico
(“desculpe, pessoal, o padre não pôde vir... bom, onde está o Santíssimo Sacramento?...”, neste momento Saides começa a caricaturar alguém), ou á uma igreja evangélica celebrada por um hare-krishna. (alguém começa a rir sozinho no meio da platéia, e todos se viram pra olhá-lo, que cala-se amedrontado e sem saber o que dizer.)

Eu não tenho medo de dizer a verdade: NO FUTEBOL, SÓ O PÚBLICO É FIEL. Quanto aos jogadores, o critério é o dinheiro, (instala-se um mórbido silêncio na sala)
e digo, sem medo de ser feliz, que quase todos os jogadores são putas. (instala-se novo tumulto) É isso mesmo. Quem é que trabalha restritamente pelo dinheiro? Mercenários e putas.
Sabe, eu quero ver um time – por pior que ele seja tecnicamente - em que todos os seus jogadores (como os torcedores) sejam fiéis até a morte.

Sonho com o dia em que surgir um time inteiramente formado por profissionais que estejam jogando até mesmo SEM NENHUM TIPO DE REMUNERAÇÃO, apenas pelo amor á camisa, e apenas pela fidelidade ao seu querido, amado, time.

Nesse dia, meus caros amigos, nesse miraculoso dia (Saides aumenta seu tom de voz) eu pegarei meu pandeiro, minha timba e minha camiseta, e serei o mais fanático dos torcedores, pois saberei que estarei torcendo por um time formado por homens honrados e leais,

E NÃO POR MERCENÁRIOS INTERESSEIROS.

(um grande silêncio se instaura em todo o salão, Saides fecha o canal de seu microfone e sai sem se despedir. Ao longe, alguma garota chora copiosamente)

Finis


esporte. [ Do ingl. sport ] S. m. 1. O conjunto dos exercícios físicos praticados com método.

futebol. [ Do ingl. football ] S. m. 1. Jogo esportivo disputado por dois times, cujo objetivo é fazer entrar uma esfera dentro de um arco defendido pelo time adversário, e na qual é vedado aos jogadores , exceto ao goleiro, tocar essa esfera com a mão.


*

Um comentário:

Cássia disse...

"seria mais interessante jogarmos com a sua cabeça!” grita alguém
hahahahaha